sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Capítulo 8- Sem espécie identificada (Para minha grande amiga: Rhebeca Murbach Neri)

 Andei até ela, e só se escutava o rangir dos meus dentes. Eu estava sedenta de sangue, e adoraria matá-la por ter dito meu nome verdadeiro. Mas, infelizmente, Sitael não deixou que eu o fizesse. Hunft! Que droga!
 Eu tive de segui-lá até uma cabana, até que bem bonitinha. Quando entrei, fiquei boquiaberta, por ver tanta parafernalia de vidente, em uma cabaninha tão pequena. Meu Deus! Como coube tudo aquilo ali?!
  Sentei em uma almofada, aparentemente bem delicada e bem bordada, frente a uma mesinha de madeira gasta. Bem gasta. Ali, tinha tipo um calendário Maia e mais umas coisinhas que eu não sabia o nome. Ela se sentou com dificuldade e finalmente voltou-se para mim.
_Então Ja... – Não a deixei terminar.
_Ananka. – Corrigi.
_Ananka...  – Por incrivel que pareça, ela assentiu. – Tenho uma coisa para você. Eu a espero a muitos e muitos anos.
_Tipo... Uns 80? – Debochei.
_75. – Respondeu ela. Eu ainda sou mais velha.
 Ela pegou do bolso, uma coisa que parecia ser um fras... Sim, era um frasco. Parecia ser feito de ouro, porque reluzia muito. Ela fitou o frasco por mais um momento e me entregou. Peguei-o, abri-o e cheirei seu conteúdo.
_Argh! – Aquela coisa fedia. Fechei-a. – Tem cheiro de sangue, enxofre e cachorro molhado. Que nojo!
_Hoje. Vá até o meio da mata, exatamente a meia-noite, esteja lá. – Disse ela. – Encontre a árvore mais bonita, com desenhos em sua madeira. Quando tocá-la e ela se acender. Beba o conteúdo do frasco.
 Coloquei o frasco no bolso de trás e tirei-o, porque... Vai que aquela merdinha quebra.
_Vá, filha. – Disse ela.
_Eu devia dizer isso. – Disse eu. – Continuo sendo mais velha que você!
                                                                                                         ***
 A noite caiu. E eu fiquei praticamente o dia todo jogando ping-pong com Kaab. Sitael me fitava sem parar, faltava uma hora para meia-noite, e eu estava cada vez mais nervosa.
_Kaab! Chega! – Disse eu ofegante, jogando a raquete em cima da mesa e rindo. – Cansei, malinha. Amanhã a gente continua jogando.
_Revanche?! – Perguntou ele.
_Ah! Pode ser. – Respondi.
 Andei até Sitael e ele estremeceu.
_O que foi? – Perguntei, preocupada, tocando seu rosto.
 Ele pegou minha mão, e sem dizer uma palavra sequer, me levou para fora da casa. Jogou-me contra a parede, e colocou os dois braços de cada lado, para que eu não tivesse como fugir.
_Ana... Jade. – Ele tremia.
 Estremeci quando ele disse meu nome verdadeiro. Aquilo foi como uma flecha que encontrou meu peito.
_Tome cuidado, pequeno anjo. – Disse ele.
 Ele disse apenas isso, até que percebi, que uma lágrima escorreu pelo seu rosto. Limpei a lágrima com a minha mão e suavemente, pressionei seu olho para que a outra lágrima não fugisse.
_Sitael, o que foi? – Perguntei.
 Ele virou-se e então, voltou-se para mim. Empurrou-me contra a parede e encaixou seus lábios nos meus. Correspondi. Não havia nada, que eu quisesse no mundo do que tê-lo para mim. Eu só o queria. A morte viria em segundo lugar. Mas ainda sim, isso era tão bom quanto morrer. Eu o amava de uma forma tão complexa, mas esse amor vinha de uma forma tão espontânea... Tão... Simples.
 Eu sentia, não só seus lábios nos meus, mas eu sentia uma conexão entre nós dois. Era uma mistura de felicidade, euforia, amor, paixão, desejo... Pecado! Mas era tão bom, e eu esperava por isso a tanto tempo. Todos os meus desejos mais profundos, foram trazidos a luz. Eu o queria, eu o amava.
 Meus lábios se abriram levemente, e isso era deseperador. Eu o queria mais e mais. Apenas ele.
 Senti algumas lágrimas se formarem em meus olhos e deslizarem pelo meu rosto. Culpa... Maldita culpa! Bem que ela poderia vir depois.
 Larguei-o, ofegante. Ele me olhou, como se aquilo tivesse lhe machucado, mas seu rosto demonstrava felicidade e prazer. Poderia até ser um erro, mas diga-se de passagem, foi um erro bem saboroso. Eu corei, assim que ele me fitou. Então olhei no relógio. Faltavam apenas trinta minutos.
 Olhei para Sitael, e dei-lhe mais um beijo. Um selinho. Apenas isso.
  Disparei a correr. Entrei na mata. Aquele lugar era escuro, sombrio e o silêncio era torturante. Exceto por alguns grilinhos e algumas corujas, fazendo barulho. Corri e a medida que eu corria, as folhas secas se partiam debaixo dos meus pés. Corri, até chegar no meio da mata, encontrei uma árvore linda e aparentemente delicada. Ela era repleta de desenhos, feitos com faca, contra a madeira. Toquei os desenhos e ela se acendeu. O brilho era azul-céu, branco, cristal e vermelho-sangue. Senti que algo prendeu meus pés ao chão, e então peguei o frasco no bolso da minha jaqueta.
 Tirei-o e cheirei seu conteúdo. Estremeci de nojo. Tapei o nariz e bebi seu conteúdo. Quando a última gota desceu pela garganta, eu senti uma dor imensuravel. Aquilo parecia me destruir. Uma dor parecida da que eu senti, quando virei vampira.
 Caí no chão. Eu mal conseguia respirar. Era como se algo não me deixasse respirar. Ofegava, e travava a respiração até que puf! Apaguei. Não sentia mais nada.
 De repente despertei, senti tudo no meu corpo mudar. As costelas pareciam se partir e crescer de novo. Não parava mais.  Até que aquilo tudo passou. Respirei tranquilamente e olhei para os lados. As coisas pareciam ter mudado. O foco da minha visão estava absurdamente excelente. Levantei, só que não da maneira comum. Rolei para o lado e me levantei sob quatro patas. PATAS?! Olhei para baixo e só vi duas patinhas. Pretas e felpudas. Comecei a tentar ver o resto de meu corpo e vi uma calda. Meu Deus! Eu era um lobo agora?
 Disparei a correr. Quis dar um grito, mas tudo que saiu foi um latido. Duro e desesperado.  Corri mais.
 “Quero voltar a ser o que eu era” – Pensei.
 Puf! 
Voltei a ser eu. Não que não fosse naquela hora. Mas era meu corpo “normal”. Sai rolando, ladeira a baixo e quando parei, vi um casaco preto. Daqueles, parecido como do Deus Thanatos. Peguei-o. Vi meus cabelos negros, presos por uma fita vermelha de seda pura. Um vestido preto que ia até os joelhos e deixavam a saboneteira e os calcanhares a mostra, me deixando extremamente envergonhada. Eu nunca mostrava o corpo. Peguei casaco, e coloquei a toca e fui andando até a aldeia. Senti meu antigo cheiro, que era bem adocicádo. Andei  e andei. Exausta e cheguei na aldeia. Olhei em volta e aparentemente estava tudo deserto. Entrei na casa. Dei passos bem leves, para não ser ouvida. Abri a porta de meu novo quarto, bem devagar e entrei. Passei diante do espelho.  Vi que eu estava encharcada de sangue. Tirei o casaco e caí na cama. Os pés sujos de terra, descalços. Não estava nem aí. Deitei e apaguei.

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